PASÁRGADA
Flavio Moutinho
Onde estou, ouviu o Primeiro Cavalariano do forasteiro de madeixas douradas.. Do alto de seu cavalo negro, contraste de peles qual tabuleiro de xadrez, o estranho prosseguiu - Há dias erro pelos prados e colinas tentando chegar a Pasárgada, mas só o que vejo são mais prados e colinas até onde a terra se transforma em firmamento.
- Quem pergunta? - quis saber o soldado.
- Leve uma notícia ao seu Senhor, Dom Manuel, o Poeta. Diga-lhe que Dom Felício, o Louro, duque das terras além de Algaravia, deseja falar-lhe...
O monótono relevo do entorno testemunhou a comoção em que as palavras de Dom Felício deixaram o pobre militar, cujos olhos bem poderiam explicar, bastante convincentemente, o dilúvio bíblico. E se pôs a contar, entre nobres soluços e engasgos, suas razões:
- O Senhor Duque então não soube do falecimento do rei Dom Manuel? Faz um lustro e meio, nosso soberano caiu doente, e não houve na corte quem lhe curasse as chagas. Vieram médicos e alquimistas. Os pulmões empedraram, diziam, tentaram diversos ungüentos, emplastros, elixires, mas nada foi capaz de o fazer voltar a respirar. Até que, na manhã do solstício de inverno, todos preparados para os festejos, sentou a alma de Dom Manuel, no céu, ao lado do bom Deus.
"Luto decretado em toda Grande Pasárgada, até o equinócio de primavera não houve bandeira hasteada de mastro inteiro; não sei, pois, como a notícia tanto tardou a chegar a Algaravia, quando sete anos já se passaram.
"Nosso caríssimo rei veio a falecer sem herdeiros. Seus irmãos, Dom Antônio e Dona Maria Cândida, havia tempo estavam mortos. Imagina, portanto, Vossa Senhoria, as batalhas que se deram pela ocupação do trono. Surgiram primos distantes de quem jamais se ouvira falar, mulheres várias a chamar seus filhos de príncipe, bastardos loucos pelo poder.
"Instalou-se, então, uma Regência Trina, formada pelo Visconde de Moraes, primeiro-ministro do falecido rei; Duque de Drummond, primo distante, terceiro ou quarto grau, trazido rapidamente de além das fronteiras com Francia; e Marquês de Andrade, um nobre até então desconhecido, Senhor de distantes terras em Macunaíma, que ninguém até hoje entendeu como fizera para compor a regência.
"Foi conturbado o período, pois, como disse, os parentes se acotovelavam por um lugar de prestígio junto à corte. Mas, graças a Deus, as trevas tinham data para terminar. Faltava um lustro para os dezoito anos da Princesa Helena, sobrinha-neta de Dom Manuel. Sua Alteza se preparava, enclausurada entre as Carmelitas, para assumir o trono de Pasárgada. Seu nome era o único consenso, mas a idade a impedia de se sagrar Rainha".
"Há dois anos, veio finalmente sua maioridade. Com a coroação da nova rainha, os ânimos se acalmaram e a paz voltou a ser soberana em Pasárgada. Por isso, diz-se por aqui que devemos nossas vidas à Rainha Helena, como antes devíamos ao rei Dom Manuel.
"Mas basta a mim de tanto falar e ao Senhor Duque de tanto ouvir. Siga-me, cavaleiro, que eu o levarei para se ter no palácio com nossa rainha".
Imagem - Zacek Yerka
* A Oficina de Escritores é uma Cooperativa de autores de fantástico, que existe na web desde 2000, cuja principal atividade é a troca de análises de textos dos cooperativados e o aprimoramento da escrita, seja através de concursos literários ( semanais, quinzenais e anuais ) ou de discussões sobre a arte da escrita.
Flavio Moutinho
Onde estou, ouviu o Primeiro Cavalariano do forasteiro de madeixas douradas.. Do alto de seu cavalo negro, contraste de peles qual tabuleiro de xadrez, o estranho prosseguiu - Há dias erro pelos prados e colinas tentando chegar a Pasárgada, mas só o que vejo são mais prados e colinas até onde a terra se transforma em firmamento.
- Quem pergunta? - quis saber o soldado.
- Leve uma notícia ao seu Senhor, Dom Manuel, o Poeta. Diga-lhe que Dom Felício, o Louro, duque das terras além de Algaravia, deseja falar-lhe...
O monótono relevo do entorno testemunhou a comoção em que as palavras de Dom Felício deixaram o pobre militar, cujos olhos bem poderiam explicar, bastante convincentemente, o dilúvio bíblico. E se pôs a contar, entre nobres soluços e engasgos, suas razões:
- O Senhor Duque então não soube do falecimento do rei Dom Manuel? Faz um lustro e meio, nosso soberano caiu doente, e não houve na corte quem lhe curasse as chagas. Vieram médicos e alquimistas. Os pulmões empedraram, diziam, tentaram diversos ungüentos, emplastros, elixires, mas nada foi capaz de o fazer voltar a respirar. Até que, na manhã do solstício de inverno, todos preparados para os festejos, sentou a alma de Dom Manuel, no céu, ao lado do bom Deus.
"Luto decretado em toda Grande Pasárgada, até o equinócio de primavera não houve bandeira hasteada de mastro inteiro; não sei, pois, como a notícia tanto tardou a chegar a Algaravia, quando sete anos já se passaram.
"Nosso caríssimo rei veio a falecer sem herdeiros. Seus irmãos, Dom Antônio e Dona Maria Cândida, havia tempo estavam mortos. Imagina, portanto, Vossa Senhoria, as batalhas que se deram pela ocupação do trono. Surgiram primos distantes de quem jamais se ouvira falar, mulheres várias a chamar seus filhos de príncipe, bastardos loucos pelo poder.
"Instalou-se, então, uma Regência Trina, formada pelo Visconde de Moraes, primeiro-ministro do falecido rei; Duque de Drummond, primo distante, terceiro ou quarto grau, trazido rapidamente de além das fronteiras com Francia; e Marquês de Andrade, um nobre até então desconhecido, Senhor de distantes terras em Macunaíma, que ninguém até hoje entendeu como fizera para compor a regência.
"Foi conturbado o período, pois, como disse, os parentes se acotovelavam por um lugar de prestígio junto à corte. Mas, graças a Deus, as trevas tinham data para terminar. Faltava um lustro para os dezoito anos da Princesa Helena, sobrinha-neta de Dom Manuel. Sua Alteza se preparava, enclausurada entre as Carmelitas, para assumir o trono de Pasárgada. Seu nome era o único consenso, mas a idade a impedia de se sagrar Rainha".
"Há dois anos, veio finalmente sua maioridade. Com a coroação da nova rainha, os ânimos se acalmaram e a paz voltou a ser soberana em Pasárgada. Por isso, diz-se por aqui que devemos nossas vidas à Rainha Helena, como antes devíamos ao rei Dom Manuel.
"Mas basta a mim de tanto falar e ao Senhor Duque de tanto ouvir. Siga-me, cavaleiro, que eu o levarei para se ter no palácio com nossa rainha".
Imagem - Zacek Yerka
* A Oficina de Escritores é uma Cooperativa de autores de fantástico, que existe na web desde 2000, cuja principal atividade é a troca de análises de textos dos cooperativados e o aprimoramento da escrita, seja através de concursos literários ( semanais, quinzenais e anuais ) ou de discussões sobre a arte da escrita.
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