Tuesday, April 25, 2006



Primeiro Lugar:

VOU-ME EMBORA PRA PASÁRGADA.
Vera do Val


- Com licença, Majestade, mais um...
- Como?
- o rei salta do trono, quase derrubando a coroa - Você tem certeza?
- Sim, Majestade... - o comandante da guarda abaixa a cabeça compungido. - acabei de ser avisado por um dos vigias das ameias. Aproxima-se, já dá para se enxergar à distância...

- Mas isso é demais! Um abuso! - o rei se desespera e começa a andar de um lado para outro no salão dourado. - Demais...
A rainha, impassível, do alto de seus um metro e noventa, não perde a compostura:
- Bem que eu lhe avisei. Ser amigo de poeta dá nisso.
Sua Majestade descabela-se:
- Lá vem você outra vez com essa ladainha.
- Ladainha ou não eu lhe avisei. O sujeito aparece aqui com aquele ar de inocência e você lhe abre as portas. Vai convidando para isso e para aquilo, empresta-lhe sua bicicleta, cede-lhe sua melhor cama, dá-lhe meia dúzia de odaliscas, um pacote de camisinhas, leva para pescar no rio, tomar banhos de mar. Até Iara para lhe contar historias você contratou. Isso para não falar no burro bravo e no pau de sebo. Queria o que?
- E ainda sai dizendo que somos todas prostitutas - diz com voz chorosa a princesa mais nova.
- Mas bem que ele era um pedaço de mau caminho - a princesa mais velha murmura esticando os olhos para o comandante.
- Calem-se, vocês duas. Não foram chamadas para essa conversa - o rei está apoplético - Já me basta sua mãe...
As princesas recolhem-se amuadas.
- O que faço Majestade? - o comandante da guarda diz baixinho, louco para se safar dali.
- Chame o Primeiro ministro.
Como se estivesse a ouvir atrás da porta entra o Primeiro Ministro ajeitando o pincenê no nariz adunco.
- Chamou Majestade?
O rei aproxima-se dele e o toma pelo braço.
- Mais um. O comandante diz que está chegando...
- Majestade, impossível receber mais um. Nossos quartos estão todos tomados, temos poetas, boêmios, andarilhos, sonhadores e malucos saindo pelo ladrão. Por dar-me lá aquela palha resolvem vir para cá. Essa gente toda acha que nossa cidade é a casa da mãe Joana. Aliás, falar em Joana até Joana a Louca de Espanha já está reclamando. Sumiram-lhe os urinóis e ela teima que é aquele poetinha cabeludo quem se apossou deles. As despensas estão vazias, o palácio depenado, a Iara vai se mandar, diz que está rouca de tanto contar historias e o burro bravo morreu. Estamos quebrados, Majestade.
- Eu bem que avisei - diz a rainha lixando as unhas.
- Como eu podia imaginar que ele ia fazer essa propaganda danada? Botar toda a historia em versos e espalhar pelo mundo? Virar essa romaria?
A rainha dá de ombros:
- Ora... Um poeta...
O bobo da corte que até aquele momento ouvira tudo calado aproxima-se do rei e segreda-lhe alguma coisa.
Sua Majestade abre um grande sorriso.
- Heureca!!! Se sua idéia der certo ganhará um balde de ouro e será nomeado Conselheiro do Reino!! Chamem os pintores. Depressa.
Dia seguinte no grande portão de ferro da entrada do castelo uma enorme tabuleta com letras garrafais:

"Pasárgada mudou-se."

2 Comments:

Blogger Leila Silva said...

Bela homenagem, Mhel. Lindo mesmo o conto da Vera, ainda vou ler os outros. Volto.
Beijos

9:59 AM  
Anonymous Anonymous said...

Adorei!
Pasárgada está aqui... e até Joana, la Loca ( ou seu espectro) já sabe.

4:07 PM  

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